terça-feira, 18 de agosto de 2015

GLOSAS CRÍTICAS A MATEMÁTICA BÁSICA E SUPERIOR (Parte I)

Movimentos Introdutórios da Crítica

A importância da Matemática na sociedade justificada pelo slogan da “matemática está em toda parte” nunca realmente me convenceu. Respostas curtas para perguntas complexas sempre acomodam graus de fanatismo, dogmatismo e idiotia. Aliás, uns dos aspectos marcantes na “comunidade de matemáticos” é a mediocridade dominadora de extrapolar as barreiras da linguagem matemática para o social/educacional/político, não por acaso é esta comunidade que estipula que a matemática é importante porque está em toda parte. Lákatos em Ciencias, Matemáticas y Epistemologia deixou claro que a filosofia sem a ciência é inócua, e a ciência sem a filosofia é infértil. Minha intenção nessa ação de glosar criticamente nossos ambientes matemáticos e de comunidade é de trazer um pouco da fertilidade da filosofia para o nosso terreno.

Se a matemática está em toda parte, cabe a pergunta “porque está ela em toda parte?”, o que lhe garante esse ar de superioridade, confiabilidade e reprodutividade e quais as consequências, científicas e sociais, destas imperativas constatações?

Skovsmose em suas inúmeras contribuições filosóficas sobre o ensino da matemática sempre pontua que a mesma atua na educação de jovens, crianças e adultos nos ambientes de aprendizagem como um filtro social, seja por se comportar como a disciplina mais odiada, menos entendida e mais cobrada, seja pelos seus usos cotidianos apresentados sob uma ideologia de certeza, na qual lhe é garantida toda a confiabilidade social, ao ponto de esta ser estimada como neutra e sem sentido material (como uma ciência ideal, pura e platônica). Se por um lado a sua apresentação idealista e purista contribui para um distanciamento educacional da disciplina (ódio, reprovações, medos), a matemática tomada sob rumos de neutralidade científica estimula a formação de homens e mulheres que não se apropriaram da mesma para suas atividades reflexivas na sociedade.


Mais do que isso é preciso que compreendamos que a linguagem matemática e seus sistemas de comprovação e cálculo estimulam determinada forma de pensar, isto é, contém em si um caráter formatador influenciado pelas maneiras como afetivamente os estudantes percebem a disciplina. Em outras palavras, uma educação matemática tradicional voltada para a neutralidade e a apresentação da disciplina como algo doloroso, difícil e puro contribui para a formação de um pensamento lógico técnico desprovido de análises sobre o que se está a fazer. Tal forma de ensinar e educar matemática formatará um modo único de fazer matemática: irracional para tudo que não é matemática, movido pelas idiotias e mediocridades do intelecto humano do senso comum, a dominadora maioria nos ambientes de matemáticos.

Suas imbricações (da matemática) com a tecnologia nos remontam a questionar que influências a tecnologia terá sobre as maneiras como enxergamos, trabalhamos e pensamos. De maneira semelhante, os usos da tecnologia, seja no ensino da matemática ou na aplicação, implicam em formatações acríticas quando a concebemos sob patamares de neutralidade e pureza. Mais do que castrar possibilidades intelectuais emancipadoras, a tecnologia e a matemática dominadas pela ideologia da certeza, propiciarão não apenas um novo modelo de pensar, mas um novo modelo de se organizar socialmente. A tecnologia não será apenas usada de maneira acrítica pelas mulheres e homens que a detiverem em uso (pois muitos não as detém!!), mas suas relações serão manipuladas a partir da maneira como esta tecnologia foi construída se utilizando dos conhecimentos científicos e humanos.

Isto é, a matemática assim como a tecnologia, não perdem sua neutralidade apenas nos usos que se fazem dela, mas principalmente devido as condições materiais e subjetivas pelas quais foram construídas: a efetividade de uma bomba em explodir é extremamente superior a efetividade do ato de querermos a usar como um vaso de flor, porque as condições materiais e subjetivas de quem a projetou são mais determinantes que os usos que faremos dela.

Não há hoje como pensar uma educação matemática, um currículo de matemática, sem pensar em suas imbricações sociais e tecnológicas. Mais do que isso, se faz necessário uma crítica radical as maneiras pelas quais são conduzidos tais cursos, de que maneira são produzidos e apropriados tais conhecimentos, e principalmente, os fazer sob um ponto de vista de classe e de crítica da sociedade dada.