Movimentos Introdutórios da Crítica
A importância da Matemática na sociedade justificada pelo slogan da
“matemática está em toda parte” nunca realmente me convenceu.
Respostas curtas para perguntas complexas sempre acomodam graus de
fanatismo, dogmatismo e idiotia. Aliás, uns dos aspectos marcantes
na “comunidade de matemáticos” é a mediocridade dominadora de
extrapolar as barreiras da linguagem matemática para o
social/educacional/político, não por acaso é esta comunidade que
estipula que a matemática é importante porque está em toda parte.
Lákatos em Ciencias, Matemáticas y Epistemologia deixou
claro que a filosofia sem a ciência é inócua, e a ciência sem a
filosofia é infértil. Minha intenção nessa ação de glosar
criticamente nossos ambientes matemáticos e de comunidade é de
trazer um pouco da fertilidade da filosofia para o nosso terreno.
Se a matemática está em toda
parte, cabe a pergunta “porque está ela em toda parte?”, o que
lhe garante esse ar de superioridade, confiabilidade e
reprodutividade e quais as consequências, científicas e sociais,
destas imperativas constatações?
Skovsmose em
suas inúmeras contribuições filosóficas sobre o ensino da
matemática sempre pontua que a mesma atua na educação de jovens,
crianças e adultos nos
ambientes de aprendizagem
como um filtro social,
seja por se comportar como a disciplina mais odiada, menos entendida
e mais cobrada, seja pelos seus usos cotidianos apresentados sob uma
ideologia de certeza, na qual lhe é garantida toda a confiabilidade
social, ao ponto de esta ser estimada como neutra e sem sentido
material (como uma ciência
ideal, pura e platônica). Se
por um lado a sua apresentação idealista e purista contribui para
um distanciamento educacional da disciplina (ódio, reprovações,
medos), a matemática tomada sob rumos de neutralidade científica
estimula a formação de homens e mulheres que não se apropriaram da
mesma para suas atividades reflexivas na sociedade.
Mais do que isso é preciso que
compreendamos que a linguagem matemática e seus sistemas de
comprovação e cálculo estimulam determinada forma de pensar, isto
é, contém em si um caráter formatador influenciado pelas maneiras
como afetivamente os estudantes percebem a disciplina. Em outras
palavras, uma educação matemática tradicional voltada para a
neutralidade e a apresentação da disciplina como algo doloroso,
difícil e puro contribui para a formação de um pensamento lógico
técnico desprovido de análises sobre o que se está a fazer. Tal
forma de ensinar e educar matemática formatará um modo único de
fazer matemática: irracional para tudo que não é matemática,
movido pelas idiotias e mediocridades do intelecto humano do senso
comum, a dominadora maioria nos ambientes de matemáticos.
Suas imbricações (da matemática)
com a tecnologia nos remontam a questionar que influências a
tecnologia terá sobre as maneiras como enxergamos, trabalhamos e
pensamos. De maneira semelhante, os usos da tecnologia, seja no
ensino da matemática ou na aplicação, implicam em formatações
acríticas quando a concebemos sob patamares de neutralidade e
pureza. Mais do que castrar possibilidades intelectuais
emancipadoras, a tecnologia e a matemática dominadas pela ideologia
da certeza, propiciarão não apenas um novo modelo de pensar, mas um
novo modelo de se organizar socialmente. A tecnologia não será
apenas usada de maneira acrítica pelas mulheres e homens que a
detiverem em uso (pois muitos
não as detém!!), mas suas
relações serão manipuladas a partir da maneira como esta
tecnologia foi construída se utilizando dos conhecimentos
científicos e humanos.
Isto é, a matemática assim como a
tecnologia, não perdem sua neutralidade apenas nos usos que se fazem
dela, mas principalmente devido as condições materiais e subjetivas
pelas quais foram construídas: a efetividade de uma bomba em
explodir é extremamente superior a efetividade do ato de querermos a
usar como um vaso de flor, porque as condições materiais e
subjetivas de quem a projetou são mais determinantes que os usos que
faremos dela.
Não há hoje como pensar uma
educação matemática, um currículo de matemática, sem pensar em
suas imbricações sociais e tecnológicas. Mais do que isso, se faz
necessário uma crítica radical as maneiras pelas quais são
conduzidos tais cursos, de que maneira são produzidos e apropriados
tais conhecimentos, e principalmente, os fazer sob um ponto de vista
de classe e de crítica da sociedade dada.

